sexta-feira, 7 de outubro de 2011

A Arte da Sedução Pedagógica na Tutoria em Educação a Distância

A notável relevância e complexidade do papel do tutor nos programas de Educação
a Distância, demonstra a necessidade de um perfil profissional com habilidades e
competências quase paradigmáticas. Espera-se que o tutor, além de possuir
domínio da política educativa da instituição onde está inserido e conhecimento
atualizado das disciplinas sob sua responsabilidade, exerça uma sedução
pedagógica adequada no processo educativo.
No modelo tradicional de ensino com a presença viva dos professores, o carisma
acentuado de alguns, reduz o desprazer e dificuldades encontradas por alunos
menos empolgados na aquisição do saber. No passado, presente e provavelmente no
futuro, a regra comum deve ser a de gostar-se das disciplinas quando o professor
desperta simpatia, quer inovando seus métodos de ensino, quer pela utilização de
seus recursos persuasivos naturais ou trabalhados. O professor-tutor investe na
construção de uma relação de respeito e confiança buscando despertar o amor para
o conteúdo, visando a superação dos obstáculos encontrados pelo aprendiz.
Os meios de comunicação, imitam a arte da sedução pedagógica ou aprendem com
ela, exercendo sobre as massas um efeito quase hipnótico, ao utilizar-se de
imagens, sons e movimentos, para cativar seu público, levando-o ao caminho
desejado.
No cenário da Educação a Distância, o papel do tutor extrapola os limites
conceituais, impostos na sua nomenclatura, já que ele, em sua missão precípua, é
educador como os demais envolvidos no processo de gestão, acompanhamento e
avaliação dos programas. É o tutor, o tênue fio de ligação entre os extremos do
sistema instituição-aluno. O contato a distância, impõe um aprimoramento e
fortalecimento permanente desse elo, sem o que, perde-se o foco.
A relação pedagógica conclama a uma construção cotidiana. Sozinho, o aprendiz
caminha vacilante, perdendo o rumo desejado. Nisso o tutor pode ampará-lo,
conduzi-lo e encaminhá-lo. À medida que o processo de aprendizagem se efetiva, a
relação do aluno com o tutor, muda, se aprofunda, estreitando o laço afetivo,
propiciando a permeabilidade educativa, uma vez que a educação deve ser vista
sempre como uma prática social ligada à formação de valores e práticas do
indivíduo para a vida social, com possibilidade de ir em direção a uma maior autonomia, liberdade e diferenciação. Um caminho e alternativa para consecução
de sua missão educativa encontrada pelo tutor em EAD é a sedução pedagógica .
    “Diante de tão grande número de ofertas visuais, performáticas e
    espetaculares na sociedade, a escola encontra-se em desvantagem, pois os
    chamados auxiliares de ensino audiovisual, a comunicação corporal do
    professor, sua retórica, não convencem. O mundo da escola é um mundo cinza,
    parado e passivo. As imagens na escola, são manipuladas como se fossem
    neutras e inofensivas, além de serem mal aproveitadas em termos de
    possibilidade educativa. Não se prepara o professor para desempenhos
    comunicativos e expressivos ao nível do desafio do ensino e das crianças
    atuais, não se prepara o professor, sobretudo, para dialogar com o mundo
    através de um universo imaginal” ( Meira, 1999, p.132)
A educadora Marly Meira, que possui uma longa trajetória dentro da
arte-educação, demonstra com a sua visão humanista, a necessidade de atualização
e aperfeiçoamento das práticas pedagógicas, seduzindo intencionalmente o
aprendiz na direção do saber libertador.
Com essa visão, entendemos que uma pedagogia progressista libertária, valoriza a
experiência de autogestão e autonomia consoante aos pressupostos desejáveis nos
programas de Educação a Distância. Pode-se dizer que a pedagogia libertária tem
em comum com a pedagogia libertadora "a valorização da experiência vivida como
base da relação educativa e a idéia de autogestão pedagógica" (LUCKESI, 1993, p.
64). Tal experiência demonstra que a concepção, a idéia de conhecimento não é a
investigação cognitiva do real mas, sim, a descoberta de respostas relacionadas
às exigências da vida social. É essencial que o tutor exerça sua práxis em duas
direções: valorização das necessidades do aluno tanto quanto aos conteúdos de
ensino.
É essencial portanto, que o profissional atuando como professor/tutor, possua
entre outras qualidades a facilidade de comunicação, dinamismo, criatividade,
liderança e iniciativa para realizar com eficácia o trabalho de facilitador,
junto ao grupo de alunos sob sua tutoria.
A capacidade para atuar como mediador e conhecer a realidade de seus alunos em
todas as dimensões (pessoal, social, familiar e escolar) é de fundamental
importância para que, de algum modo, ele ofereça possibilidades permanentes de
diálogo, sabendo ouvir, sendo empático e mantendo uma atitude de cooperação e
possa oferecer experiências de melhoria de qualidade de vida, de participação,
de tomada de consciência e de elaboração dos próprios projetos de vida.
Com o enfoque de uma tutoria voltada para captar a atenção do aluno, é
importante que o tutor demonstre competência individual e de equipe para
analisar realidades, formulando planos de ação coerentes com os resultados de
análises e de avaliação, mantendo deste modo uma atitude reflexiva e crítica
sobre a teoria e a própria prática educativa envolvida no processo.
Verifica-se dentro de uma abordagem humanista que, para Rogers, “as experiências
de vida, o clima psicológico da sala de aula, a integração professor/tutor-aluno
são fatores importantes para a aprendizagem”. (ROGERS, Carl, Belo Horizonte,
Interlivros: 1977:73-76). Rogers enfatiza os aspectos dinâmicos e ativos do
ensino que reforçam o processo de interação na aprendizagem e considera o aluno
capaz de auto-direcionar-se, desde que em ambiente propício e interessante.
Sendo portanto, fundamental que o tutor seja capaz de utilizar estratégias
psicopedagógicas e técnicas diversificadas, bem como alternativas de previsão,
conhecimento e intervenção nos âmbitos e locais adequados.
O tutor estará aplicando coerentemente todo o poder de uma pedagogia sedutora,
ao identificar suas próprias capacidades e limitações para atuar de forma
realista com visão de superação. Tal percepção possibilitará uma efetiva
comunicação entre os diferentes níveis, quer institucional ou no corpo dos
alunos tutorados.
Uma vez que, segundo Roger, o ser humano tem uma propensão para aprender, o
papel do tutor também será o de facilitar a apreensão do saber estimulando o
interesse do aprendiz pela discussão de suas expectativas e auxiliando-os a
superar os obstáculos transitórios.
É fundamental que o tutor seja capaz de auxiliar os seus alunos no planejamento
das atividades programadas, promovendo e provocando a intercomunicação de modo a
atingirem os objetivos da formação e desenvolvam a capacidade de analisar
problemas e a raciocinar criticamente.
 A construção da autonomia pelo reforço positivo
A prática e a observação pedagógicas nos demonstram, que os sentimentos de
inferioridade começam cedo em crianças durante o seu processo formativo na
primeira infância. Elas precisam ser notadas, apreciadas e amadas do modo como
são. Necessitam sentir que têm um significado, que “estão-no-mundo” e são
alguém. Os conflitos entre os pais, as constantes mudanças de escola, bairro ou
cidade acrescida da falta de disciplina adequada, são condições que podem gerar
insegurança numa criança. O conseqüente reforço negativo e punições sofridos na
adolescência, pode conduzir o aprendiz a uma possível cristalização de
inseguranças múltiplas que afetariam seu processo de aprendizagem durante toda a
vida.
    "O pai reclama do filho até que cumpra uma tarefa: ao cumpri-la, o filho
    escapa às reclamações (reforçando o comportamento do pai). ...Um professor
    ameaça seus alunos de castigos corporais ou de reprovação, até quem resolvam
    prestar atenção à aula; se obedecerem estarão afastando a ameaça de castigo
    (e reforçam seu emprego pelo professor). De uma ou outra forma, o controle
    adverso intencional é o padrão de quase todo o ajustamento social - na
    ética, na religião, no governo, na economia, na educação, na psicoterapia e
    na vida familiar.(Skinner, 1971, pp. 26-27)
Skinner demonstra em seu programa experimental na sua teoria da aprendizagem,
que a eficácia do reforço depende da proximidade temporal e espacial em relação
ao comportamento que se que pretende modelar, sob pena de incidir sobre outro
que não esteja em questão e que um reforço positivo fortalece a probabilidade do
comportamento pretendido que segue. O seu registro é a presença (positividade)
de uma recompensa e por outro lado um reforço negativo enfraquece um determinado
comportamento em proveito de outro que faça cessar o desprazer com uma situação.
Portanto, o seu registro é a ausência (retirada) de um estímulo que cause
desprazer após a resposta pretendida.
Em linguagem laica, crianças severamente punidas na infância exibem
comportamentos desajustados com os padrões sociais da nossa sociedade e têm mais
probabilidade de se tornarem adultos e aprendizes não-qualificados. No entanto,
indivíduos que recebam recompensas adequadas passarão a exibir comportamentos
sociais mais ajustados e terão melhores qualificações ligadas ao processo de
aprendizagem.
Por esta visão, cabe ao tutor promover recompensas positivas aos seus
aprendizes. É incontestável a alegria de uma criança ou adulto ao receber
publicamente do mestre, um elogio sincero pelo trabalho entregue no prazo, pela
avaliação acima da média ou mesmo pelo simples esforço e dedicação aos estudos.
Tal recompensa propiciará o reforço da auto-estima, encaminhando o aprendiz na
direção da sua autonomia, que no entender de Piaget , significa estar apto a
cooperativamente construir o sistema de regras morais e operatórias necessárias
à manutenção de relações permeadas pelo respeito mútuo. Ele também caracterizava
autonomia “como a capacidade de coordenação de diferentes perspectivas sociais
com o pressuposto do respeito recíproco". (Kesselring T. Jean Piaget.
Petrópolis: Vozes, 1993:173-189).
A criança nasce sem saber amar, portanto ela tem que aprender a amar. Quando se
ama, se confia. O amor exige disposição para ouvir, significa compartilhar
experiências. É importante, elogiar o desempenho do aprendiz , louvando sua
responsabilidade, pontualidade e desempenho.

Habilidades e competências essenciais na tutoria
Para exercer o fascínio dos aprendizes e mantê-los atentos, motivados e
orientados é necessário captar a atenção dos mesmos, demonstrando domínio das
ferramentas de trabalho que irá utilizar na tutoria. O tutor sedutor impressiona
pela capacidade de demonstrar os atalhos, o manejo eficaz das ferramentas que
estão à sua disposição para o exercício da tutoria. Para tanto é imprescindível
gostar do que faz e fazê-lo com amor. É vital que demonstre interesse pela
melhoria do processo ensino-aprendizagem e esteja com disponibilidade para o
contato com o aluno, sobretudo quando solicitado. O tutor, tal qual um pai, deve
dentro das suas limitações temporais, estar pronto para ouvir, apoiar e orientar
o filho quando este solicitar. Sem essa disponibilidade, o fio se rompe,
tornando-se difícil à retomada da relação pedagógica em níveis satisfatórios. A
falta de confiança no tutor, o desamparo sofrido pelo aprendiz num determinado
momento da sua jornada, em geral, leva à evasão irreversível e ao desapontamento indesejável para os envolvidos no sistema educacional. É o sentimento sofrido
por uma criança quando se atira sem medo nos braços do pai-protetor e este a
deixa cair indesculpavelmente. A indiferença machuca e afasta.
Apesar do tutor não ser um terapeuta, é fundamental que ele seja continente,
controlando as angústias e necessidades que possam emergir do grupo tutorado,
assim como, por outro lado, conter as suas próprias angústias frente aos
sentimentos, dúvidas e outros fenômenos emergentes do processo dinâmico do
processo ensino-aprendizagem.
Da mesma forma que se requer em outras atividades profissionais, cabe ao
professor-tutor manter um comportamento profissional e ético irrepreensível. O
bom exemplo moral e ético é uma das formas mais poderosas de sedução a ser
exercida por um educador. O tutor evitará impor os próprios valores e
expectativas, mas sim, favorecer um alargamento do espaço de cada um dos membros
do grupo através da escuta e valorização de diferentes idéias e opiniões,
mantendo o sigilo daquilo que lhe foi dado em confiança, apontando alternativas
de solução para as questões apresentadas, indicando os recursos disponíveis na
instituição e estimulando que o próprio grupo se mobilize para as necessidades
detectadas.
Dentre as várias habilidades de um bom tutor, a empatia que resulta da
capacidade de se colocar no lugar do outro, propiciando uma sintonia afetiva e a
capacidade de comunicação, expressa na escuta atenta e respeitosa, são elementos
componentes vitais no exercício da tutoria sedutora. A arte da paciência e
tolerância deve fazer parte da práxis pedagógica, uma vez que é importante a
tolerância às limitações dos membros do grupo, assim como a compreensão das
eventuais inibições e ritmo de cada um deles.
No papel de mediador entre o saber e o aprendiz, o tutor sedutor tem a perfeita
consciência de que não é ele o detentor exclusivo do conhecimento, mas antes de
tudo, é uma ponte para a fluência dos saberes em construção. O mestre
sapientíssimo, Paulo Freire aponta o papel crucial que o professor deverá
desempenhar:
    “Se a educação é dialógica, é óbvio que o papel do professor, em qualquer
    situação, é importante. Na medida em que ele dialoga com os educandos, deve
    chamar a atenção destes para um ou outro ponto menos claro, mais ingênuo,
    problematizando-os sempre. O papel do educador não é o de «encher» o
    educando com ‘conhecimento’, de ordem técnica ou não, mas sim o de
    proporcionar, através da relação dialógica educador-educando, a organização
    do pensamento correto de ambos. (Freire, 1992).
No exercício da arte de seduzir pedagogicamente, o professor-tutor deve buscar a
autenticidade dos seus atos pedagógicos e pessoais, já que é visto como um todo,
devendo zelar pela verdade, já que esta, no campo pessoal e intelectual,
simboliza o caminho para exercício da confiança, da criatividade e da liberdade
dentro do grupo e fora dele.
Finalmente, como bem afirma o mestre Anísio Teixeira, vale ressaltar que “o mais
perfeito método de aquisição, de uma habilidade, não poderá ser aplicado
rigidamente. O educador terá de levar em conta que o aluno não aprende nunca uma
habilidade isolada; que, simultaneamente, estará aprendendo outras coisas no
gênero de gostos, aversões, desejos, inibições, inabilidades, enfim que toda a
situação é um complexo de radiações, expansões e contrações", (TEIXEIRA, Ciência
e arte de educar. Educação e Ciências Sociais. v.2, n.5, ago. 1957. p.5-22), o
que implica na linguagem de Dewey, que não se deve permitir um comportamento
uniforme ou rígido.
É importante ousar na arte de educar, buscando conhecer todos os métodos e
recursos já experimentados e provados. Torna-se imperativo a todos envolvidos na
tutoria em Educação a Distância, romper velhos paradigmas e abraçar a missão de
educar sem medo. Sem o receio de se aproximar demais, de estreitar os laços de
afeto e, sobretudo sem o excessivo pudor de exercer por amor a sutil arte de
seduzir pedagogicamente os que esperam com avidez pelo saber libertador.

Matias Gonzalez de Souza
Ministério da Educação e Cultura – SEED - Proinfo
mathiassouza@mec.gov.br